Aquelas leituras formadoras de culturas (Caicó-RN, século XIX)
Caicó-Rio Grande do Norte. Século XIX. História da leitura. Práticas de leituras
A leitura feita do livro Seridó − século XIX (fazendas & livros), dos historiadores
Medeiros Filho e Faria, foi o que sugeriu a escrita desta tese de doutorado. A leitura intensiva
desse livro conduziu ao corpus documental da investigação (livros escolares, religiosos e
laicos, crônica, discursos, documentos eclesiásticos, inventários, testamentos, memórias de
infância, matérias jornalísticas, relatórios), e também ao corpus do referencial teóricometodológico
da história cultural da leitura, em correspondência com Roger Chartier e Robert
Darnton. No rigor da escrita da tese, a investigação concernente à temática leitura e absorções
culturais conduziu-nos a definir como objeto de estudo as práticas culturais apropriadas
pertinentemente das leituras feitas, ouvidas, murmuradas, muitas vezes repetidas e
memorizadas, de livros impressos escolares, religiosos e laicos que circulavam em Caicó, nos
oitocentos. Em vista da leitura intensiva e da extensiva, o objetivo é analisar, por um lado,
indícios de absorções ou apropriações culturais dos ensinamentos daquelas práticas de leitura
e, por outro, os entrelaces dos ensinamentos relativos à oralidade, à leitura, à escrita e à
escolarização. A tese defendida é que a história da leitura em Caicó, no século XIX, é a
história da leitura feita, ouvida, murmurada, repetida e, ainda, memorizada, que, apoiada
sobre textos de livros escolares, religiosos e laicos, convertia-se na produção de bens culturais
específicos, como cartas, inventários, remédios homeopáticos e caseiros, testamentos, rezas
fortes de cura, versos de cordel, dentre muitos outros. Começando com o propósito de
escrever uma história da leitura em Caicó, no século XIX, alcançamos o entendimento de que
as práticas culturais, especialmente as práticas dos costumes seridoenses, são, sobremaneira,
resultado das apropriações de leituras de textos escolares, religiosos e laicos, incentivadoras
de outras práticas de leituras intensivas e extensivas. Se a leitura feita, ouvida, repetida,
memorizada e reconhecida é encadeadora de práticas de costumes universais e locais, não
obstante teria sido a força da oralidade a pedra de toque da reprodução e da longevidade dessa
leitura, bem como de sua travessia do século XIX para o XX e, ainda, dos resquícios de certas
permanências neste século XXI. Em parte, essa rede de práticas culturais, reproduzida pela
força da transmissão oral, persiste desde os tempos de nossos trisavôs.