O fixo e seus fluxos potenciais: economias de movimento e padrões de dispersão urbana numa rede de localidades litorâneas entre João Pessoa--PB e Natal--RN
ocupação esparsa, pequenas localidades litorâneas, rede urbana, economias de movimento, Sintaxe do Espaço
Esta pesquisa investiga o quanto a distribuição de localidades esparsas é efeito do potencial de movimento propiciado pela configuração viária abrangendo todo o conjunto dessas localidades. A área observada compreende uma malha viária que bordeja parte do litoral da Paraíba e Rio Grande do Norte, conectando pelo menos 160 localidades pulverizadas na superfície de 25 municípios de João Pessoa-PB a Natal-RN entre o mar e uma rodovia federal que perpassa essas duas capitais. O objetivo é detectar padrões de dispersão urbana numa rede de múltiplas cidades e pequenas localidades por meio do esgarçamento da noção de cidades enquanto economias de movimento. A tese é de que o potencial fluxo (pessoas, objetos, informação) gerado pelos fixos (edificações, infraestrutura, equipamentos) ajuda a entender o próprio processo de afixação e que o movimento é estruturante também do espaço periurbano, intersticial, menos edificado. O princípio das cidades enquanto economias de movimento proposto por Bill Hillier (1996) tem se mantido válido em um aporte representativo de estudos de centralidade intraurbana. Tal princípio é filiado à teoria da Lógica Social do Espaço (HILLIER & HANSON, 1984), cujo axioma é que, sendo sociedade indissociável do espaço, padrões espaciais revelam padrões sociais e seu instrumento e Análise da Sintaxe do Espaço. Cidades enquanto economias de movimento acompanhou a discussão sobre o processo de geração de lugares na cidade (cidades fazem o lugar), amadurecida com a ideia de que a conformação urbana é duplamente estruturada por movimentos de longo e curto alcance. A questão de como tratar os padrões de alcance que ultrapassam o limite periurbano foi aprofundada por por Kimon Krenz (2018) ao propor a morfologia regional, um mix de Sintaxe do Espaço com a Teoria dos Lugares Centrais de Christaller (1933, 1966), esta baseada numa disposição estática de atratores. O presente trabalho se bifurca da morfologia regional dando mais ênfase no potencial custo de deslocamentos, fortemente afetado por componentes de aleatoriedade, cujo o campo de possibilidades é depreensível pela análise da configuração a despeito da atratividade estática dos centros. A expressão fixo e fluxos é emprestada de Milton Santos, desta vez tendo o fixo denotando a configuração e o fluxo, seus efeitos. O oportunamente, Milton Santos revisou a Teoria dos Lugares Centrais descrevendo dois circuitos de influência estática entre cidades, dualidade que, ao longo o presente estudo, demonstrou congruente com a estrutura dual generativa proposta por Hillier. O método consiste na confrontação de mapas de acessibilidade topológica considerando ângulos nas mudanças de direção (HILLIER, 2012) com mapas de localidades e áreas densamente edificadas; as coincidências e disparidades entre disposição, porte da ocupação e acessibilidade são investigadas na busca de padrões combinando adensamento/dispersão edilícia e movimento. Um raio de alcance longo e um mediano foram escolhidos para prospectar estruturas concentradoras de potencial de movimento. O resultado é que, na rede de localidades esparsas observada, algumas localidades praianas relativamente afastadas das capitais, coincidentemente turísticas e de veraneio em remanescentes de antigos povoamentos coloniais em baías, enseadas e barras de rio, se aninham em uma estrutura de centralidade altamente acessível posicionando praias e capitais no mesmo nível hierárquico de propensão a passagem de rotas, mesmo com parte destas perpassando extensos interstícios caracterizados por ocupação edilícia rarefeita — a conformação é a de um pente, cujo o dorso é a rodovia federal paralela ao mar e os dentes são os acessos perpendiculares até a costa. Simultaneamente, o miolo intraurbano de pequenas localidades é alinhavado por uma outra estrutura de centralidade e movimento, atinente a rotas de alcance intermediário, que podem transbordar o tamanho da localidade mas sem abranger todo o sistema. A dupla estrutura esbarra em vestígios do legado de caminhos capilarizados a partir do mar e braços de rios, intervalados por extensos canaviais centenários, por onde atalhos do pente capital-praiano de acessos recorrentemente se esquivam de grande parte das pequenas localidades, dentre elas as ribeirinhas e indígenas. A conclusão é que a configuração revela que praias de destinação turística se localizam a custos de deslocamentos potencialmente menores na área observada, de certo modo costurando-se topologicamente às capitais, portanto revelando que a aparente atratividade praiana é respaldada. A conclusão é que, sendo a aparente atratividade praiana, periférica às capitais, respaldada por custos de deslocamentos potencialmente menores, uma espécie de economia do movimento é reveladora de sutilezas na disposição de pequenas localidades não tão apreensíveis, ou o são de modo mais trabalhoso, por vieses de atratividade genericamente baseados em cumulação de bens e serviços, ao menos no caso estudado. A noção de que a disposição de localidades esparsas em conjunto se guie pelo movimento abre perspectivas para o refinamento, ao nível de trechos de rua e circuitos de mobilidade, de estudos sobre a ocupação periurbana e redes urbanas em escala regional.