ENTRE A POESIA, O DELÍRIO E A LETRA
NA ESCRITA DE ANTONIN ARTAUD
Escrita bruta. Língua. Análise do discurso. Psicanálise. Artaud.
Sabemos o quanto é conhecida a posição crítica e revolucionária do poeta e dramaturgo Antonin Artaud (1896 – 1948), frente à linguagem canônica, sobretudo desde o período em que foi membro do movimento artístico surrealista, entre 1924 e 1926, o qual se fundamentava no discurso livre das amarras racionais, repressoras do sujeito desde sua infância. Seus integrantes eram fascinados pela maravilha do imaginário e, em suas criações, atingiam o ápice desse universo que bordejava a loucura. Esta pesquisa procura visualizar a escrita de Artaud sem dar-lhe um estatuto de mais um estudo de caso clínico, mas o de um sujeito que, apesar do sofrimento da psicose, se expressou pela arte, especialmente literária e teatral, também como meio de preservar sua existência, de sobrexistir. Portanto, em foco estará a assinatura de sua escrita feita pelo ente e não apenas pelo doente. Para isso, há que se contrapor a escrita tradicional e a escrita psicótica (bruta), rastreando-se entre elas elementos comuns e diferenciais, sem a adoção da teoria a priori. Parte da obra será analisada como a de um sujeito-autor que, de fato, viveu a poesia em ato! Contudo, com a luz da análise intertextual crítica, teremos importantes balizas teóricas; a saber: do lado da psicanálise, os trabalhos de Sigmund Freud e Jacques Lacan; da Análise do Discurso (AD), a orientação da escola francesa segundo a ótica de Dominique Maingueneau; dentre estudiosos de Artaud, os filósofos Gilles Deleuze e Jacques Derrida, o psicanalista Félix Guattari e a filósofa e psicanalista Julia Kristeva, e o literato e filósofo Maurice Blanchot, além de vários outros estudos. O corpus, dentre outros escritos de Artaud, é delimitado pelas cartas feitas para seu médico, Gaston Ferdière, quando de sua internação no asilo de Rodez, na França, entre 1943 e 1946, e publicadas no livro Nouveaux Écrits de Rodez (1977), inédito no Brasil. Assim, penetramos na interface dos discursos literário e psicótico de um “sujeito em processo”, Artaud; perguntando-nos que lugar ocupa como autor, qual o intento das neoformações linguísticas no embate com a língua materna usual, qual o efeito da escrita para sua (re)inscrição como sujeito social.