O Grotesco em Famintos – A experiência estética no ensino de literatura
Luis Romano; Famintos; Grotesco; ensino de literatura; estética da recepção.
Um dos princípios da estética clássica condiciona a obra de arte aos preceitos de harmonia e beleza. Com o intuito de agradar ao seu público, torna-se, portanto, indispensável ao artista o respeito às regras de composição, à verossimilhança, aos fins morais e à imitação da Natureza como fatores determinantes para a representação do Bem, do Belo e do Verdadeiro. No entanto, inúmeros artistas e escritores das mais diversas épocas empregaram em suas criações procedimentos bastantes diferentes, para não dizer opostos, aos moldes do classicismo. Em razão disso, adotou-se para o presente estudo as análises desenvolvidas por Victor Hugo (2002) e Wolfgang Kayser (1986) sobre uma categoria estética a que se veio nomear de Grotesco e em especial a noção de realismo grotesco formulada por Mikhail Bakhtin (1993). De acordo com esses autores, o exagero e a deformação do corpo característicos do grotesco induzem o leitor a perceber uma realidade por vezes oculta. Identificado como um constituinte predominante no romance Famintos, do escritor caboverdiano Luis Romano, o grotesco assume, dessa forma, uma função dupla: apresentar o tema da fome não apenas em seus significados sociais, mas também em seus efeitos sobre o corpo. Nesse sentido, tomando como ponto de partida as considerações de Jauss (1994) sobre o horizonte de expectativa de uma obra, pode-se dizer que a recepção do texto em que o grotesco predomine se situa em um ponto desconhecido no horizonte de expectativas do leitor. Por isso, em razão do inusitado e surpreendente, considera-se para a proposta de leitura de Famintos (1962) a centralidade do leitor como produtor de um segundo texto, construído no primeiro ato da leitura, que é, nessa instância inicial, resultado único de sua capacidade interpretativa subjetiva. Pensando nisso, este trabalho finaliza com o relato de uma experiência de atividade prática de leitura em sala de aula baseada na ideia de realismo grotesco elaborada por Bakhtin (1993). Essa atividade foi determinante para perceber, entre os estudantes, a leitura como experiência estética e refletir sobre os problemas relacionados à presença da literatura na escola.