O iluminismo tardio no cemitério dos vivos: o manicômio judiciário no contexto da reforma psiquiátrica brasileira
periculosidade, manicômio judiciário, reforma psiquiátrica, internação compulsória
Esta pesquisa analisa os saberes e práticas dos operadores do direito e da psiquiatria que contribuem para o distanciamento da
Unidade Psiquiátrica de Custódia e Tratamento de Natal (UPCT), única instituição destinada ao cumprimento de medida de segurança
de internação compulsória no Rio Grande do Norte, dos princípios que orientam o processo de reforma psiquiátrica brasileira.
Problematiza a justaposição dos fenômenos da loucura e da criminalidade e o reclamo histórico por políticas públicas que se
fundamentam no enclausuramento de vidas em nome de um ideal de segurança pública. A partir da análise da centralidade que
medidas custodiais passaram a ocupar no direito penal e na psiquiatria e pautando-se nos postulados da Análise Institucional, propõe
uma discussão acerca dos desafios atuais da instituição frente ao novo delineamento da Política Nacional de Saúde Mental, introduzida
pelo processo de elaboração crítica e prática da reforma psiquiátrica, que produziu uma ruptura com o modelo historicamente
consolidado da psiquiatria. Metodologicamente, a pesquisa adotou uma perspectiva qualitativa, utilizando-se uma estratégia de
observação da realidade institucional, com a qual se coletou dados atualizados acerca das condições de funcionamento da UPCT. Em
seguida, procedeu-se a análise de autos processuais relativos aos internos da instituição, através da qual foram verificados os
argumentos que fundamentam a aplicação da medida de internação compulsória. Por fim, foram realizadas entrevistas
semiestruturadas com alguns juízes criminais da capital e com a médica psiquiatra responsável pela instituição, onde se descortinou a
interface do campo da saúde mental com a justiça. A partir dos analisadores que emergiram da leitura dos dados construídos no
campo, observaram-se as linhas de forças que atuam nesse dispositivo e que o fazem permanecer resistente ao processo de
reorientação no campo da atenção psicossocial. Os resultados demonstram como os saberes e práticas se articulam e atravessam o
espaço asilar, moldando-o como um conjunto molar enrijecido e praticamente indiferenciado de outras estruturas prisionais comuns,
diante da falência completa de um projeto terapêutico direcionado ao louco infrator.