Banca de QUALIFICAÇÃO: DOUGLAS DA SILVA ARAÚJO

Uma banca de QUALIFICAÇÃO de MESTRADO foi cadastrada pelo programa.
DISCENTE : DOUGLAS DA SILVA ARAÚJO
DATA : 23/06/2017
HORA: 17:00
LOCAL: A definir
TÍTULO:

Fluxo do sistema de justiça criminal para os crimes domésticos: uma análise da impunidade do crime de ameaça a partir do Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher


PALAVRAS-CHAVES:

Violência contra a mulher; Crimes domésticos; Impunidade; Política criminal; Fluxo de justiça; Poder judiciário


PÁGINAS: 25
RESUMO:

O presente estudo pretende identificar quais fatores são preponderantes nos processos em trâmite no Juizado da Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, instância que compõe o sistema da justiça criminal, para aferir os níveis de impunidade do crime de ameaça quando cometido no âmbito da Lei Maria da Penha (Lei n.º 11.340/2006).

De acordo com Michel Misse, o crime possui sua construção social compreendida após o entendimento dos significados de alguns níveis analíticos que são interligados, a saber, a criminalização, a criminação, a incriminação, e a sujeição criminal. A criminalização seria uma ação tipicamente definida como crime. A criminação de um fato se dar pelas “sucessivas interpretações que encaixam um curso de ação local e singular na classificação criminalizadora” (MISSE, 1999). A incriminação do suposto sujeito acontece através de testemunhas e evidências do ato delituoso. E a sujeição criminal, como assegura o autor, é a seleção preventiva de supostos sujeitos que irão compor um tipo social cujo caráter é socialmente considerado como “propenso a cometer um crime”.

Os delitos cometidos no âmbito doméstico podem se amoldar nessa lição sugerida por Misse, no que diz respeito ao enquadramento de uma conduta como sendo um crime a partir de sua exteriorização à esfera pública. É sabido que nessa espécie de delito, pelas circunstâncias de intimidade em que ocorre, ainda é muito difícil para vítima denunciar o agressor, o qual, na maioria das vezes, mantém com ela uma relação de convivência diária. Nesse esteio, a violência doméstica é silenciosa porque as mulheres, ou por medo ou por vergonha, não revelam tudo que se passa (ROCHA, 2010), dificultando o processo de reconhecimento e punição de seus agressores. A violência doméstica é definida a partir de um aspecto espacial, considerando que ocorre entre membros interligados por uma relação familiar, que compartilham o mesmo ambiente, não delimitado aqui apenas as extensões físicas. 

Visando coibir esses atos de violência contra a mulher, foi editada em 2006, a Lei n.º 11.340, conhecida por Lei Maria da Penha (LMP), composta por dispositivos legais que conferem mais rigor às punições sobre crimes domésticos (BRASIL, 2006), tornando-se a política pública mais importante do Brasil nos últimos anos, no que diz respeito ao enfrentamento e repressão dessa espécie de violência.

O artigo 7º[1], da referida lei, veio tratar de todas as formas de manifestação de violência doméstica e familiar, não apenas da violência de natureza física, sexual, ou psicológica, comumente mais conhecidas, mas abrangendo outras espécies de violência, como a patrimonial e a moral. O referido artigo engloba, dentre outros delitos, o crime de ameaça, tipificado no art. 147 do Código Penal, isto é, quando o referido crime é praticado em prejuízo à mulher, obedece-se às regras descritas pelo artigo 13 da Lei 11.340/06, respeitando a aplicação do princípio da especialidade.

Em que pesem tais avanços, a LMP ainda deixa muito a desejar quando se fala em punição, em criminalização dos sujeitos que cometem os delitos definidos pela lei. Por ser considerado um delito de proximidade, na medida em que ocorrem entre pessoas que possuem algum tipo de vínculo afetivo, os envolvidos possuem grande dificuldade em administrá-los e levá-los a conhecimento da autoridade policial.

Nessa perspectiva, percebe-se que uma das principais hipóteses que levam os casos de violência à impunidade é, provavelmente, a possiblidade de retratação da vítima, seja pela não representação ou pela renúncia ao direito de processar o ofensor, nos crimes em que são permitidos tais institutos, ou mesmo sua desistência em prosseguir com a notitia criminis levada a efeito perante a autoridade policial.

Deve se ter em mente que a efetividade prática de uma espécie normativa depende da forma com que a máquina judiciária age diante dos conflitos sociais (ALMEIDA, 2007, p. 76). Sendo assim, a desistência da vítima de processar seus agressores, muitas vezes fomentada por uma relação de dependência financeira e/ou emocional, é fator preponderante na reflexão sobre a efetividade da LMP.

Nesse prisma, a renúncia por parte da vítima se mostra como obstáculo à efetivação da LMP. Associada a outras causas, como a morosidade na tramitação dos processos, tais fatores apresentam-se como gargalos diante o Sistema de Justiça Criminal no que diz respeito ao processamento eficiente desses delitos, acarretando uma sensação da impunidade por parte da população. Esses são alguns dos fatores (gargalos) que podem estar presente no fluxo do SJC dos crimes domésticos, e são sobre eles que esta pesquisa pretende se debruçar.

Visando alcançar o objetivo proposto, esse trabalho considerará, sob o prisma metodológico, o modelo de fluxo[2] para avaliar o funcionamento do sistema da justiça criminal para o crime de ameaça cometido no âmbito doméstico, sob uma análise longitudinal prospectiva, analisando a tramitação dos processos iniciados e quais deles alcançaram a fase de sentença.

Em outras palavras, esta pesquisa se dará pelo mapeamento de processos que envolvam casos de violência doméstica, especificamente no que diz respeito ao delito de ameaça, tipificado no art. 147, do CP, iniciados perante o Poder Judiciário (Juizado da Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher), e dentre eles quais obtiveram sentença e/ou quais foram arquivados/extintos. Para tanto, será realizada uma pesquisa documental, explicativa dos fatores de impunidade e de morosidade no tratamento do crime em questão.

No Juizado da Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher será realizado o citado mapeamento dos processos distribuídos, envolvendo os casos capitulados como crime de ameaça e enquadrados pela Lei n.º 11.340/2006.

Será ainda necessário fazer uma triagem do material presente no respectivo juizado, separando os processos pela espécie de crime, pelas datas mais preponderantes durante toda sua tramitação, desde a comunicação à autoridade policial, até a prolação de eventual sentença, pelas características da vítima e do agressor, bem como pela sua ligação/parentesco, além de outros dados presentes no questionário de pesquisa.

Ao final, após todo o levantamento de dados, serão elaboradas tabelas a fim de representar graficamente os resultados obtidos para, assim, proceder com as devidas induções acerca do material coletado.

A impunidade, nesta pesquisa, será aferida a partir da relação (razão) existente entre os processos iniciados perante o Juizado da Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher e quais alcançaram a fase de sentença (efeito funil); pelo tempo de duração dos processos; bem como pela incidência de casos em que as vítimas, durante o andamento dos processos, renunciaram o direito de processar seus agressores.



[1] Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.

[2] O estudo do fluxo da Justiça Criminal é um poderoso instrumento de reflexão sobre acesso diferencial à Justiça e é ainda pouco explorado no Brasil. Embora tenhamos um crescente número de estudos nos últimos anos, ainda são poucos os estudos que procuram identificar e investigar os processos de filtragem dos envolvidos nos crimes (VARGAS, J.D e RIBEIRO, L.M.L. 2008. “Estudos de Fluxo da Justiça Criminal: Balanço e Perspectivas”. 32º Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu, MG, 2008).


MEMBROS DA BANCA:
Presidente - 1012850 - RODRIGO FIGUEIREDO SUASSUNA
Interno - 1014897 - CLAUDIO ROBERTO DE JESUS
Externo à Instituição - CAROLINA CHRISTOPH GRILLO - USP
Notícia cadastrada em: 09/06/2017 11:42
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